Esta pesquisa, resultado do Trabalho de Conclusão de Curso desenvolvido no primeiro semestre de 2025, examina a estrutura filosófica (proveniente do dualismo metodológico e do relativismo) pela qual Gustav Radbruch (1878-1949) desestabiliza os paradigmas dominantes da teoria jurídica ocidental. Partindo da crise epistemológica gerada pelos totalitarismos do século XX, demonstra-se que a Rechtsidee (Ideia de Direito) radbruchiana estabelece uma síntese dialética entre a facticidade (enquanto realidade) e sua dimensão axiológica (enquanto valor). Para Radbruch, o direito é uma realidade (fato cultural) referido a valores (Ideia de Direito). Através de método dedutivo, o estudo revela como a tríade justiça-finalidade-segurança jurídica (componentes da Ideia de Direito) constitui uma estrutura de valores que exigem contínua harmonização. Como destacaria posteriormente Arthur Kaufmann –seu mais destacado intérprete e continuador teórico–, esta abordagem representa uma terceira via metodológica que evita tanto um decisionismo valorativo quanto um formalismo normativista, mantendo o direito como fenômeno (realidade) dotado de intencionalidade axiológica (valoração). A investigação confirma que a superação da dicotomia Sein (ser) e Sollen (dever-ser) fundamenta-se na redefinição do Direito como fenômeno cultural — realidade empírica intrinsecamente vinculada a valores. Neste quadro, a justiça (Gerechtigkeit) transcende o formalismo: concretiza-se como igualdade proporcional, demandando distinções substantivas baseadas em critérios racionais. Contudo, sua realização plena é impossibilitada pela tensão permanente com a finalidade (Zweckmäßigkeit), que ancora o ordenamento a objetivos (conteúdos), e com a segurança jurídica (Rechtssicherheit), garantia de estabilidade institucional. A pesquisa evidencia que esta tríade encontra um paradoxo: cada elemento, quando elevado absolutamente, degenera em distorções: a justiça sem segurança gera arbitrariedade; a segurança desligada de valores consagra a opressão; a finalidade desregrada degenera em instrumentalismo. Assim se fundamenta a célebre Fórmula de Radbruch, marco do pós-positivismo: normas positivas perdem validade quando sua injustiça atinge "um grau intolerável" (unerträgliches Maß), rompendo o vínculo mínimo com a equidade. Aqui, o positivismo jurídico é transcendido não por um retorno ao jusnaturalismo, mas pela afirmação de que a validade do Direito pressupõe sua pretensão de correção material. Tal princípio implica que sistemas normativos que negam radicalmente a dignidade humana —como verificado em ordenamentos totalitários— produzem meras simulações coercitivas, destituídas de legitimidade ética: ou seja, na concepção de Radbruch, um não-direito. O dever jurídico, nesta perspectiva, origina-se não da mera coação (positivismo jurídico normativista, segundo a matriz epistemológica estabelecida por Kelsen), mas da relação necessária entre obrigatoriedade normativa e mínimo ético estabelecido na razão prática (em sua influencia claramente kantiana). Conclui-se que o legado radbruchiano reside em forjar uma alternativa às antinomias tradicionais da Ideia de Direito. Sua teoria não apenas respondeu aos desafios históricos do século XX, mas oferece um modelo dinâmico para sociedades pluralistas, onde o Direito se (re)constrói permanentemente na fronteira entre estabilidade e transformação. A atualidade da Ideia de Direito em Gustav Radbruch manifesta-se precisamente em sua capacidade de fundamentar, sem dogmatismos, uma concepção de Direito que seja resistente contra a barbárie normativa: uma fórmula contra a arbitrariedade legal.
Esta publicação expõe uma parte considerável do que é feito anualmente em pesquisa na UNIVALI e por meio da qual esperamos compartilhar os conhecimentos aqui produzidos, possibilitando a comunicação entre os pesquisadores de nossa e de outras instituições.