O Supremo Tribunal Federal, fortalecido por arranjos institucionais da Constituição de 1988, e mesmo da Emenda Constitucional n. 45/2004, entendeu por lançar mão da Inteligência Artificial para acelerar a execução de parte de suas funções. Ocorre que, no contexto da revolução da tecnologia da informação e do capitalismo cognitivo, de amplitude global, tais ferramentas servem como instrumentos de captura de instituições dos Estados nacionais por interesses nem sempre compatíveis com as finalidades propostas em suas constituições - algo especialmente gravoso no caso brasileiro, no qual a accountability do STF é especialmente limitada. O presente artigo propõe-se a examinar criticamente o uso da Inteligência Artificial no âmbito jurídico em geral e pelo STF em particular, analisando os seus objetivos e consequências, bem como a sua inserção no contexto geral do capitalismo cognitivo e da Governança por Números; e demonstrar a necessidade de transparência e controle, por instituições políticas representativas, acerca do funcionamento de tais instrumentos, assim evitando ou mesmo mitigando a colonização da jurisdição constitucional brasileira pelo capitalismo transnacional. Para tais finalidades, o presente estudo lança mão do método indutivo, com auxílio das técnicas da categoria, do conceito operacional, do referente e da pesquisa bibliográfica.
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Os Anais de Constitucionalismo, Transnacionalidade e Sustentabilidade, desenvolvidos pela Associação Internacional de Constitucionalismo, Transnacionalidade e Sustentabilidade, tem como missão servir à comunidade acadêmico científica, tanto nacional como internacional, como um instrumento de informação e divulgação de produtos científicos produzidos por meio dos eventos organizados pela Associação Internacional. A referida Associação já existia anteriormente a 2015 na forma de Associação de Pesquisa e teve sua atuação e seus objetivos ampliados em 2015 quando foi formalizada.