AUTONOMIAS INDÍGENAS NA BOLÍVIA: ENTRE A AUTODETERMINAÇÃO E A COLONIALIDADE

Autores

DOI:

https://doi.org/10.14210/nej.v28n3.p448-469

Palavras-chave:

Autonomias indígenas, Autodeterminação, Povos indígenas, Estado Plurinacional, Colonialidade

Resumo

Contextualização: Como um dos logros do constitucionalismo latino-americano, a Constituição Política do Estado Plurinacional da Bolívia reconheceu, normativamente, o direito “a autonomia, ao autogoverno, a cultura, ao reconhecimento de suas instituições e a consolidação de suas entidades territoriais, conforme a Constituição e a lei”. O Estado Plurinacional assume um compromisso com a garantia da autodeterminação e autogoverno das nações e povos indígenas originários campesinos e para possibilitá-la prevê a criação de autonomias indígenas originárias campesinas, previstas no artigo 289 e seguintes e reguladas pela chamada Lei Marco das Autonomias e Descentralização “Andrés Ibáñez”. No entanto, as disposições da regulação e procedimentos exigidos para a configuração da autonomia indígena exigem que os povos adotem a lógica de pensamento e estruturação que embasam o próprio Estado, como referendo, estatuto e controle de constitucionalidade pelo Tribunal Constitucional Plurinacional.

Objetivo: Tem-se como objetivo geral analisar o processo que resultou na criação da Autonomía Guaraní Charagua Iyambae, na Bolívia, abordando as contradições e a persistência da lógica colonial na instrumentalização do compromisso de garantir autodeterminação dos povos.

Método: A metodologia utilizada resulta da combinação dos métodos de abordagem indutivo e dialético, dos métodos de procedimento monográfico e comparativo e das técnicas de pesquisa bibliográfica, documental e visita técnica à região analisada.

Resultados: Como resultado, verifica-se que a autodeterminação garantida pela constituição encontra obstáculos às exigências feitas pelo próprio texto constitucional e legislação regulamentadora. No entanto, há evidências de que tais povos vêm se utilizando desses instrumentos para fazer frente ao Estado desde fora e, ao mesmo tempo, de dentro.

Biografia do Autor

Amanda Ferraz da Silveira, Pontifícia Universidade Católica do Paraná

Doutoranda e Mestra em Direito, na área de concentração Direito Socioambiental e Sustentabilidade, pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. É bolsista de fomento da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES/PROEX). Professora contratada da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS). Naviraí, Mato Grosso do Sul, Brasil. Endereço eletrônico: aferraz.silveira@gmail.com.

Manuel Caleiro, Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul

Professor de Ensino Superior na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), Unidade de Naviraí. Professor no Programa de Pós-Graduação em Educação e Territorialidade, na Linha de Pesquisa Território e Sustentabilidade, da Faculdade Intercultural Indígena (FAIND), da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e Professor no Programa de Pós-Graduação em Direito Agrário (PPGDA), da Universidade Federal de Goiás (UFG). Doutor em Direito, na área de concentração Direito Socioambiental e Sustentabilidade, pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Mestre em Direitos Coletivos e Cidadania pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP). Naviraí, Mato Grosso do Sul, Brasil. Endereço eletrônico: manuelcaleiro@gmail.com.

Heline Sivini Ferreira, Pontifícia Universidade Católica do Paraná

Professora Adjunta do Curso de Graduação e do Programa de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Doutora e Mestra em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Curitiba, Paraná, Brasil. Endereço eletrônico: hsivini@yahoo.com.br.

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Publicado

2023-12-20

Como Citar

FERRAZ DA SILVEIRA, A.; MUNHOZ CALEIRO, M.; SIVINI FERREIRA, H. AUTONOMIAS INDÍGENAS NA BOLÍVIA: ENTRE A AUTODETERMINAÇÃO E A COLONIALIDADE. Novos Estudos Jurí­dicos, Itajaí­ (SC), v. 28, n. 3, p. 448–469, 2023. DOI: 10.14210/nej.v28n3.p448-469. Disponível em: https://periodicos.univali.br/index.php/nej/article/view/18612. Acesso em: 27 abr. 2024.

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